Eu quero as minhas

Boeing 737-800, 5 de abril de 2009.

É comum não dar-lhes a importância devida, afinal de contas sua composição química é relativamente simples, uma mera solução salina. Produzi-las artificialmente em sua própria cozinha é fácil e ao alcance de todos. É curioso notar que mesmo tendo consciência desta simplicidade franciscana que beira a banalidade, sejamos reticentes e até contrários ao esforço de produzi-las. Esta reticência talvez derive da inferência que é indevidamente feita, em relação às características daquelas pessoas que as produzem de modo natural e espontâneo; denominações relacionadas à fraqueza, emotividade, feminilidade excessiva e imaturidade são quase que automaticamente atribuídas ao vê-las fluindo, destarte as razões que motivaram sua geração. Proferir esta proposição e aceitar esta perspectiva significa adotar um comportamento vigilante para impedir a ocorrência de estados que culminem com sua produção. Ocorre que nem sempre é possível exercer controle total! Há eventos inesperados que sinalizam tardiamente a ocorrência de estados indesejáveis e, nestes casos, emerge, quase sempre, em espasmos descontrolados, sua geração de forma efusiva. Nestas ocasiões não há como atenuar o efeito deletério que este fenômeno tem sobre a racionalidade que não prevalece, sendo estraçalhada de forma irremediavelmente vergonhosa e escancarada. Este destempero convulsivo é quase sempre vinculado uma sobrecarga emocional advinda de situações de extrema satisfação ou de perda irreparável, quando a racionalidade de modo pífio desmorona e deixa-nos à mercê da torrente que flui, flui, flui e como se fosse um fluido vital leva consigo nossa energia, deixando-nos exaustos e desfalecidos. Ao tempo em que a experimentação desta transição expõe, por um lado, a nossa incapacidade de reagir premeditadamente, ela revela, por outro lado, uma faceta ímpar da nossa condição humana. Explorar esta faceta traz um benefício catártico e enseja uma lateralidade que, se devidamente valorizada, amplia nossa percepção do universo. Entretanto, independente da interpretação que decidamos atribuir a este experimento, é impossível negar que ele favorece um relampejo sentimental cuja carga semântica muda a cada vez, a cada caso e para cada indivíduo. Ciente disto, não há como não rechaçar a primeira proposição que é reacionária, repressora e preconceituosa. Com alguns poucos ciclos neuronais poderíamos identificar que há vantagens, até mesmo de cunho Darwiniano, na exploração dos estados e eventos que experimentamos quando vivenciamos estas citadas transições. Tendo dito ou não dito, eu acolho, eu valorizo e hoje reclamo ostensivamente aquelas que são exclusivamente e egoisticamente minhas, dizendo: Eu quero as minhas!